24 de ago. de 2009

Ementas VII: 2 Disc ( " Disciplina: Antropologia e Gênero" // "Estudos de Sexualidade, Gênero e Corporalidade"

Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas / Departamento de Antropologia

Disciplina: Antropologia e Gênero Código: FLA 0362 2. Disciplina prioritária ou indicação de conjunto: 3. Curso: Ciências Sociais / Créditos - 4 Professora responsável: Heloisa Buarque de Almeida

Objetivos: Esta disciplina visa introduzir os alunos da graduação na área dos estudos de gênero, com um enfoque que aproxima a antropologia com outras áreas das humanidades. Gênero tornou-se uma categoria e uma reflexão teórica muito relevante nas ciências humanas nas últimas três décadas. Sua produção teórica específica tem tido um desenvolvimento e uma produção crescente desde a década de 1970, em diálogo com as teorias sociais, com reflexões acerca das formas de poder e de desigualdade que são social e culturalmente produzidas. Os debates sobre gênero dialogam intensamente com as revisões acerca dos conceitos de sociedade, natureza, cultura, poder, violência, e com as questões de direitos humanos.

A disciplina apresenta a área dos estudos de gênero mostrando inicialmente sua relação com os debates fundamentais da antropologia (como a dicotomia natureza/cultura). Reconhecendo as relações desta área com a questão das formas de poder, a disciplina aponta para a forma como o conceito de gênero advém dos estudos sobre mulheres e dos estudos feministas. Nesse debate com os trabalhos sobre mulheres e com as propostas feministas, a disciplina explora também o problema contemporâneo da identidade e de seu papel político. A partir da bibliografia que construiu a noção de gênero nos anos 70, a disciplina busca acompanhar os desdobramentos teóricos posteriores em diálogo intenso com áreas afins à antropologia. Também se pretende explorar as relações entre gênero e outras formas de diferenciação social, como a questão da raça e o problema que advém do reconhecimento da extrema diversidade entre as mulheres.

Conteúdo: A questão na teoria antropológica clássica; A revisão da dicotomia natureza e cultura; A influência do pensamento foucaultiano – desconstruindo o sexo; O conceito de gênero e seus desdobramentos; Mulheres, feminismo, gênero e o problema da identidade; Gênero e poder.

Métodos utilizados: Aulas expositivas e dialogadas, seminários.

Atividades discentes: Leitura da bibliografia indicada, participação nas discussões em classe, apresentação de seminários.

Critérios de avaliação da aprendizagem: Seminários, participação nas aulas, e provas escritas em classe

CRONOGRAMA – 1º semestre de 2008

25 e 26 de fevereiro de 2008

Apresentação do programa com aula introdutória sobre gênero na antropologia e o trabalho pioneiro de Margaret Mead. Distribuição de seminários entre os grupos, apresentando os textos e os roteiros de leitura. Leitura e comentários do texto de Bila Sorj: “O estigma das feministas”.

Vídeo: Margaret Mead

3 e 4 de março de 2008

Algumas reflexões sobre o corpo e sobre as relações entre homens e mulheres na teoria antropológica

Leituras obrigatórias (2 seminários):

MAUSS, Marcel: “As Técnicas do Corpo” in: Sociologia e Antropologia, São Paulo, Cosac e Naify, 2003 (na edição mais antiga: “As Técnicas Corporais”)

CLASTRES, Pierre: "O arco e o cesto" in: A Sociedade Contra o Estado, Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1978.

Leituras complementares e referências que serão apresentadas em aula:

MEAD, Margaret: Sexo e Temperamento, São Paulo, Ed. Perspectiva, 1999. Introdução, “A padronização do temperamento sexual”, “O inadaptado”, Conclusão.

DOUGLAS, Mary: Pureza e Perigo, Lisboa, edições 70, 1991 - Introdução, “Poderes e perigos” e “Limites externos”

Revisão do cronograma: passar alguns textos, como do Mauss, como supostos e já conhecidos, e sugestões de leituras para quem não os conhece.

Incluir artigos com mais conteúdos empíricos e resultados de pesquisa, dialogando com a teoria:

Miguel Vale de Almeida: “Género, Masculinidade e Poder: revendo um caso do sul de Portugal”, Anuário Antropológico/95, RJ, Tempo Brasileiro, 1996

Artigos dos cadernos pagu – artigo da Guita e Marcella sobre violência doméstica; artigo de Osmundo sobre raça e gênero (n. 23); Amélio Robles (n. 22), para refletir melhor sobre intersecções e desigualdades Kamala Kempadoo (n. 25). Naara Luna sobre NTR (n. 21) e talvez o seguinte sobre aborto (a verificar).

no Gênero em Matizes: Artigo da Érica, da Paula?

10 e 11 de março de 2008

O trajeto entre Mulheres, Feminismo e Gênero na reflexão da Antropologia

Leitura obrigatória:

FRANCHETO, Bruna, CAVALCANTI, M. L. V. C., HEILBORN, M. L.: "Antropologia e Feminismo", Perspectivas Antropológicas da Mulher. Rio de Janeiro, Zahar, vol.1, n.1, 1981.

– colocar como leitura complementar?

Leituras complementares e textos usados para preparar aula:

MAUSS, Marcel: “Uma categoria do espírito humano: a noção de pessoa, a de ‘eu’.” in: Sociologia e Antropologia, São Paulo, Cosac e Naify, 2003

DUMONT, Louis: O Individualismo, Rocco, Rio de janeiro, 1993 – Introdução

PISCITELLI, Adriana. “Recriando a (categoria) mulher?”. In: Leila Algranti (org.) “A prática feminista e o conceito de gênero”. Textos Didáticos, nº 48. Campinas, IFCH-Unicamp, 2002, pp. 7-42.

ROSALDO, Michelle "O uso e o abuso da antropologia: reflexões sobre o feminismo e o entendimento inter-cultural". Horizontes Antropológicos, ano 1, n.1. 1995

17 e 18 de março de 2008 – semana da pátria

24 e 25 de março de 2008

Debate inicial sobre a passagem natureza e cultura, e o começo do uso do termo “gênero” na antropologia.

Leituras obrigatórias:

LÉVI-STRAUSS, Claude: "A família", in: SHAPIRO, Harry: Homem, cultura e sociedade, Ed. Fundo de Cultura, 1956 (há uma versão do mesmo texto em O olhar distanciado - capítulo 3)

RUBIN, Gayle: “O Tráfico de Mulheres: notas sobre a ‘economia política’ do sexo”, tradução de Júlio Simões do artigo originalmente publicado em: REITER, Rayna (Ed.): Toward an Anthropology of Women. Nova York, Monthly Review, 1973. (especial atenção à introdução, da pág. 1 a 4, a parte sobre Lévi-Strauss, pp.16 a 33, e a conclusão da p. 50 até o final)

Leituras complementares e textos usados para aula:

MATHIEU, Nicole-Claude: “Homme-culture e femme-nature?” L’Homme, Tomo XII, 1973, n. 3

MACCORMACK , Carol: “Nature, Culture and Gender: a critique” in: Carol MACCORMACK e Marilyn STRATHERN, (orgs.) Nature, culture and gender. Cambridge, Cambridge University Press, 1980.

ROSALDO, Michelle e LAMPHERE, Louise: A Mulher, A Cultura, A Sociedade, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1979 [1972]

31 de março e 1 de abril de 2008

Ainda no debate natureza X cultura – debates contemporâneos a partir da desconstrução da “natureza” do sexo por Michel Foucault

Leitura obrigatória:

FOUCAULT, Michel: História da Sexualidade – A vontade de saber, Vol. 1, Rio de Janeiro, Graal, 1977 (capítulo I, capítulo IV partes 1, 2 e 3, e capítulo V)

7 e 8 de abril de 2008

Na trilha de Foucault: a desconstrução da “natureza” da diferença entre os sexos

Leitura obrigatória:

LAQUEUR, Thomas: Inventando o sexo: corpo e gênero dos gregos a Freud, Rio de Janeiro, Relume-Dumará, 2001 – capítulos 1 e 6

Leitura complementar:

ROHDEN, Fabíola: “O corpo fazendo a diferença”, Mana, v.4 n.2 Rio de Janeiro out. 1998 (disponível no scielo)

14 e 15 de abril de 2008

Sobre o conceito de Gênero e seus usos (indicar em aula as contribuições posteriores, Butler, Haraway, Lauretis)

Leituras obrigatórias:

SCOTT, Joan: “Gênero: uma categoria útil de análise histórica”, Educação e Realidade, Porto Alegre, 16 (2), jul-dez 1990, pp. 5-22 (ATENÇÃO: NÃO usem

traduções incompletas desse texto que circulam pela internet, nem mesmo a tradução feita pelo SOS Corpo – estão INCOMPLETAS e não apresentam todo o argumento)

– colocar como leitura complementar

(21 de abril – feriado)

22 de abril de 2008

Revisão para turma da noite, alunos da tarde podem comparecer. Aula dialogada, tirar dúvidas, rever textos.

28 e 29 de abril de 2008

Prova escrita e individual sobre toda matéria, feita em sala, sem consulta.

5 e 6 de maio de 2008 Gênero e parentesco

Leituras obrigatórias:

PISCITELLI, Adriana. “Nas fronteiras do natural. Perspectivas feministas, gênero e parentesco”. Revista Estudos Feministas, Rio de Janeiro, v. 6, n. 2, p. 305-323, 1998.

STRATHERN, Marilyn: "Necessidade de Pais e Necessidade de Mães" Estudos Feministas, Vol. 3, n. 2, 1995.

Livro usado para complementar a aula:

YANAGISAKO, Sylvia e COLLIER, Jane. (orgs.) Gender and kinship: essays toward a unified analysis. Stanford: Stanford University Press. 1987.

STRATHERN, Marilyn. Reproducing the future: anthropology, kinship and the new reproductive technologies. Manchester: Manchester University Press, 1992.

12 e 13 de maio de 2008

O problema da identidade e Refletindo sobre as intersecções – gênero e raça

Leituras obrigatórias:

HALL, Stuart: A Questão da Identidade Cultural, Textos Didáticos n. 18, IFCH-Unicamp, 1995 (ou A questão da identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro, DP&A, 1999 – são duas edições do mesmo texto)

STOLCKE, Verena: “Sexo está para gênero assim como raça para etnicidade?”, Estudos Afro-Asiáticos, n. 20, 1991

Leituras complementares:

BARTH, Frederik: “Grupos étnicos e suas fronteiras” in: POUTIGNAC, P. et al: Teorias da Etnicidade, São Paulo, Ed. UNESP, 1998.

CARNEIRO DA CUNHA, Manuela: “Etnicidade: da cultura residual, mas irredutível” in: Antropologia do Brasil, São Paulo, Brasiliense/EDUSP, 1986

BRAH, Avtar: “Diferença, diversidade, diferenciação”, cadernos pagu, 26, 2006, pp. 329-376

APPIAH, Kwame Anthony: Na casa de meu pai, Contraponto, 1997 (prefácio, capítulo 2)

19 e 20 de maio de 2008 Gênero, sexualidade e novas inflexões ao conceito de gênero

Leituras obrigatórias:

BUTLER, Judith. Problemas de Gênero. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2003. Prefácio, Capítulo 1 (itens 1, 2, 3 e 4) e Conclusão

HARAWAY, Donna: “‘Gênero’ para um dicionário marxista”, cadernos pagu, 22, 2004, pp.201-246

26 e 27 de maio de 2008 Problemas de direitos humanos e de justiça

Leituras obrigatórias:

NADER, Laura: “Num Espelho de Mulher: Cegueira normativa e questões de direitos humanos não resolvidas”, Horizontes Antropológicos, ano 5, n.10, 1999

FRASER, Nancy: “Da redistribuição ao reconhecimento? Dilemas da justiça numa era ‘pós-socialista’”, Cadernos de Campo, n.14/15, ano 15, 2006.

Leituras complementares:

FRASER, Nancy: “O que é crítico na teoria crítica? Habermas e gênero”, ex aequo (Revista da associação portuguesa de estudos sobre as mulheres), n. 8, 2003. Publicado originalmente em BENHABIB, Seyla e CORNELL, Drucilla: Feminism as Critique – on the politics of gender, Minneapolis, University of Minnesota Press, 1987

2 e 3 de junho de 2008 Trabalho final, individual: escolher um artigo e fazer uma resenha, mostrando as relações entre a pesquisa que trata o artigo e alguns dos textos lidos na disciplina. Até 3 páginas, espaço 1,5, letra tamanho 12.

Escolher por tema de interesse do aluno, opções abaixo:

- Miguel Vale de Almeida: “Género, Masculinidade e Poder: revendo um caso do sul de Portugal”, Anuário Antropológico/95, RJ, Tempo Brasileiro, 1996

- ENGEL, Magali: “Psiquiatria e Feminilidade” em Del Priori, M. (org.): História das Mulheres no Brasil, São Paulo, Contexto, 1997

- Elisiane Pasini: “Prostituição e diferenças sociais” in: H.B. Almeida et alli (orgs.) Gênero em Matizes, Bragança Paulista, EDUSF, 2001

- Paula Camboim de Almeida: “Gravidez na adolescência em grupos populares urbanos: concepções de idade e maternidade”, in: H.B. Almeida et alli (orgs.) Gênero em Matizes, Bragança Paulista, EDUSF, 2001

- Érica Renata de Souza: “Construindo ‘masculinidades femininas’: educação, corpo e violência na pré-adolescência”, in: H.B. Almeida et alli (orgs.) Gênero em Matizes, Bragança Paulista, EDUSF, 2001

- Flavia de Mattos Motta: “ ‘O sexo dos anjos’: gênero e representações sobre os animais no litoral catarinense”, in: H.B. Almeida et alli (orgs.) Gênero em Matizes, Bragança Paulista, EDUSF, 2001

- Daniel S. Simião: “Itinerários transversos – gênero e o campo das ONGs no Brasil” , in: H.B. Almeida et alli (orgs.) Gênero em Matizes, Bragança Paulista, EDUSF, 2001

- Maria Celeste Mira: “O masculino e o feminino nas narrativas da cultura de massas ou o deslocamento do olhar”, Cadernos Pagu, n. 21, 2003 (pegar no www.scielo.br)

- Gabriela Cano: “Amélio Robles, andar de velho soldado: fotografia e masculinidade na Revolução mexicana”, Cadernos Pagu, n. 22, 1004 (pegar no www.scielo.br)

- Osmundo Pinho: “O efeito do sexo: políticas de raça, gênero e miscigenação”, Cadernos Pagu, 23, 2004

- Paula Sandrine Machado: “O sexo dos anjos: um olhar sobre a anatomia e a produção do sexo (como se fosse) natural”, Cadernos Pagu, n.24, 2005

- Kamala Kempadoo: “Mudando o debate sobre o tráfico de mulheres”, Cadernos Pagu, n. 25, 2005

- Martha Célia Ramirez: “A propriedade do corpo – o lugar da diferença nos discursos de homens e mulheres acerca do aborto voluntário”, Cadernos Pagu, n. 15, 2000

- Alinne de Lima Boneti: “Entre femininos e masculinos: negociando relações de gênero no campo político”, cadernos pagu, n. 20, 2003

- Claudia Fonseca: “Ser mulher, mãe e pobre” em Del Priori, M. (org.): História das Mulheres no Brasil, São Paulo, Contexto, 1997

- Mariza Corrêa: “Repensando a Família Patriarcal Brasileira” in Arantes, A.A. et al: Colcha de retalhos – estudos sobre família no Brasil, Campinas, Ed Unicamp, 1993

- Suely Kofes: “Entre nós mulheres, elas as patroas e elas as empregadas” in Arantes, A.A. et al: Colcha de retalhos – estudos sobre família no Brasil, Campinas, Ed Unicamp, 1993

9e 10 de junho de 2008

Outras referências bibliográficas complementares:

Bronislaw Malinowski. A vida sexual dos selvagens. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1983 (edição esgotada).

Edmund Leach “Nascimento Virgem” in: Roberto Da Matta (org.) Edmund Leach , São Paulo, Editora Ática.

Claude Lévi-Strauss: Estruturas Elementares do Parentesco, Petrópolis, Vozes, 1982 (capítulos 1 a 5)

Marilyn Strathern. O Gênero da Dádiva, Campinas, Ed. Unicamp, 2007 (capítulos a definir)

Anne Fausto-Sterling. “Dualismos em duelo”. cadernos pagu, 17/18, 2002, p.9-79.

Beth Lobo: “A vida como obra”. cadernos pagu, 12, 1999, pp.55-58

Martha Ramirez: “Do centro à periferia: os diversos lugares da reprodução nas teorias de gênero” in H.B. Almeida et alli (orgs.) Gênero em Matizes, Bragança Paulista, EDUSF, 2001

Donna Haraway: “Saberes localizados: a questão da ciência para o feminismo e o privilégio da perspectiva parcial”, cadernos pagu, 5, 1995, pp.7-41

Josefina Fernández: “Los cuerpos del feminismo” (mimeo)

Stuart Hall: “Que ‘negro’ é esse na cultura negra?” in: Da Diáspora: identidades e mediações culturais, Belo Horizonte, Ed. UFMG, 2003

Judith Butler: “Fundamentos contingentes: o feminismo e a questão do ‘pós-modernismo’” cadernos pagu, n. 11, 1998.

Miguel Vale de Almeida: “Género, Masculinidade e Poder: revendo um caso do sul de Portugal”, Anuário Antropológico/95, RJ, Tempo Brasileiro, 1996

Henrietta Moore: “Fantasias de poder e fantasias de identidade: gênero, raça e violência” cadernos pagu, 14, 2000, pp.13-44

Teresa De Lauretis, "A Tecnologia do Gênero" in: Heloisa Buarque de Hollanda (org.), Tendências e Impasses - O Feminismo como Crítica da Cultura, Rio de Janeiro, Rocco, 1994.

Pierre Bourdieu “A Dominação Masculina”. Educação e Realidade, n.20, vol. 2, 1995.

Mariza Corrêa: “O Sexo da Dominação” Novos Estudos CEBRAP, n. 54, Julho, 1999.

Mariza Corrêa: “Fantasias Corporais” in: Adriana Piscitelli, Maria Filomena Gregori e Sérgio Carrara: Sexualidades e Saberes: Convenções e Fronteiras, Rio de Janeiro, Garamond, 2004

Maria Filomena Gregori: “Relações de violência e erotismo”. cadernos pagu, 20, 2003, pp. 87-120.

FLS5234 – Estudos de Sexualidade, Gênero e Corporalidade

Professor responsável: Júlio Assis Simões

Primeiro Semestre 2009

Nas últimas três décadas, os estudos sociológicos e antropológicos de sexualidade tornaram-se uma área crescentemente dinâmica de pesquisa e reflexão, apesar de, paradoxalmente, ainda não serem plenamente legitimados nas ciências sociais entre nós. Boa parte desse dinamismo proveio da conexão com outros temas afins de grande impacto na teoria social contemporânea, como gênero e corpo. Uma marca comum desses estudos é o esforço de articular questões convencionalmente tidas como afeitas à esfera da subjetividade a uma compreensão renovada de processos sociais e políticos mais amplos, propiciando assim um diálogo intenso e profícuo com a revisão de conceitos como natureza, pessoa, indivíduo, sociedade, cultura e poder.

A pesquisa e a reflexão contemporâneas sobre sexualidade nas ciências sociais têm insistido num conjunto instigante e fértil de proposições teóricas e programáticas. O ponto de partida é a conceituação da sexualidade como produto histórico, associado modernamente a estratégias de regulação e disciplina social. Esse enfoque salienta a importância das chamadas “minorias sexuais” para a o exame dos processos de reprodução e naturalização das idéias dominantes sobre sexo e gênero. Contribui também para questionar o caráter supostamente estável das categorias e identidades sexuais, ao chamar atenção para sua fluidez e fragmentação interna; investigando as dissociações entre desejo, comportamento e identidade, e documentando os modos como sexualidades, gêneros e corpos são feitos na prática cotidiana, ao longo das trajetórias de vida e da experiência social.

Embora essas preocupações, muitas vezes, apareçam como desenvolvimentos recentes – notadamente como resultante do inegável impacto da obra de Michel Foucault e de seus desdobramentos em certas vertentes do pensamento feminista, dos estudos gays e lésbicos e da chamada teoria queer – é possível rastrear sua relevância em tradições estabelecidas na sociologia e na antropologia, especialmente as teorias sobre a construção social da realidade, que frutificaram em abordagens como o interacionismo simbólico, os estudos sobre “desvio”, “estigma” e “rotulação”, bem como as reflexões sobre os perigos e poderes socialmente atribuídos à ambigüidade e à marginalidade.

Este curso procura oferecer uma visão dos desenvolvimentos dessas idéias e sua repercussão, situando criticamente o interesse que o tema da sexualidade têm despertado nas ciências sociais e no debate público. Na primeira unidade, trabalharemos a diversidade das expressões históricas e culturais da sexualidade, estabeleceremos a articulação entre sua regulação e sua produção social nas chamadas sociedades modernas e ressaltaremos o caráter estratégico das formas de conhecimento, controle e resistência das sexualidades “periféricas”, “minoritárias” ou “anormais” para a emergência tanto desse campo de estudos como de sua arena de lutas sociais. Na segunda unidade, revisitaremos algumas abordagens clássicas da sexualidade nas ciências sociais, com vistas a avaliar sua relevância para a conformação das tendências teóricas e metodológicas que norteiam o campo de estudos atuais. Na terceira unidade, refletiremos sobre alguns aportes na teoria e na pesquisa mais recentes, considerandos continuidades e deslocamentos em relação às tradições referidas e novas perspectivas postas pelo estudo da sexualidade e suas materializações em produções corporais e práticas sociais, em conexão com outros marcadores de diferença. Ao longo do curso daremos destaque à significativa produção realizada no Brasil.

Espera-se que os estudantes participem ativamente das discussões em classe, bem como redijam obrigatoriamente um ensaio final individual, como parte da avaliação. O curso demandará uma carga apreciável de leitura – e a leitura de textos em inglês é requisito fundamental para acompanhá-lo. Leituras complementares serão indicadas oportunamente em cada sessão. Além disso, sendo um curso avançado, em nível de pós-graduação, ele pressupõe o domínio de um conjunto de referências básicas sobre sexualidade e gênero nas ciências sociais. A avaliação será feita com base na participação nas atividades em classe, que podem incluir a preparação de seminários, a combinar, e a elaboração do ensaio final. Este poderá consistir em uma reflexão sobre temas específicos de pesquisa de cada estudante, desde que promova um diálogo efetivo com a bibliografia discutida nas diversas unidades.

Cronograma

24/mar

1. Introdução ao curso e à temática: sexualidade nas ciências sociais. Apresentação da disciplina e seu cronograma. Apresentação dos alunos. Organização das atividades

- Jeffrey WEEKS. O corpo e a sexualidade. In: Louro, Guacira Lopes, org. O corpo educado. Belo Horizonte: Editora Autêntica, 2000, p. 35-81.

- Carole VANCE. A antropologia redescobre a sexualidade. Physis, 5 (1995): 7-32.

Unidade 1 – Por uma visão desnaturalizante e histórica da sexualidade.

31/mar

2. Sexualidade e diversidade histórico-cultural: leituras etnográficas

- Paul VEYNE, Sexo e poder em Roma. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008. 4ª Parte: O casal e a sexualidade em Roma.

- Pierre CLASTRES. O arco e o cesto. In: Clastres, P. A sociedade contra o Estado. São Paulo: Cosac Naify, 2003.

- Gilbert HERDT. Guardian of the flutes: idioms of masculinity. Chicago, The University of Chicago Press, 1994. Preface to the 1994 edition, p. xi-xvi; Introduction, p. 1-19.

- Maria Luiza HEILBORN. Construção de si, gênero e sexualidade In: Heilborn. M. L., org. Sexualidade: o olhar das ciências sociais. Rio de Janeiro; Jorge Zahar Editores, 1999.

- Don KULICK. Travesti: prostituição, sexo, gênero e cultura no Brasil. Rio de Janeiro, Fiocruz, 2008. Cap. 3: Um homem na casa.

07/abr – Feriado da Semana Santa

14/abr

3. Regulação social e produção social da sexualidade: o foco nas “sexualidades periféricas”.

- Michel FOUCAULT. História da sexualidade 1 – A vontade de saber. [1977]. Rio de Janeiro, Graal, Rio de Janeiro, Graal, 2001, 14ª. Ed.

21/abr – Feriado de Tiradentes

- Definir os temas do ensaio final e apresentar uma proposta por escrito na aula seguinte.

28/abr

4. Situando uma “ideologia sexual moderna”: o sexo como fonte primordial de autodefinição pessoal. A tradição da sexologia médica em questão.

- Paul ROBINSON, A modernização do sexo. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1977. Cap. 1, Havelock Ellis, p. 11-55; Cap. 2, Kinsey, p.56-142.

- Jeffrey WEEKS. Sexuality and its discontents: meanings, myths and modern sexualities. Routledge & Kegan Paul, 1985. Cap. 4: ‘Nature has nothing to do with it’: the role of sexology.

- Ann Marie SOHN. O corpo sexuado. In: Corbain, A; Courtine, J.-J.; Vigarello, G., org. História do corpo 3 – As mutações do olhar. O século XX. Petrópolis, Vozes, 2008.

- Paula Sandrine MACHADO. Intersexualidade e o “consenso de Chicago”: as vicissitudes da nomenclatura e suas implicações regulatórias. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 68 (2008) 109-123.

Unidade 2 – Revisitando abordagens socioantropológicas da sexualidade

05/mai

5. Revisitando as teorias da construção social: reflexões sobre homossexualidade masculina, papel social e identidade política.

-Mary MCINTOSH. The homosexual role. [1968]. In: Nardi, P. & Schneider, B., org. Social perspectives in lesbian and gay studies. Londres: Routledge, 1998.

-John MARSHALL. Pansies, perverts and macho men: changing conceptions of male homosexuality. In: Plummer, K., org. The making of the modern homosexual. Londres: Hutchinson, 1981.

- Peter FRY. Da hierarquia à igualdade: a construção histórica da homossexualidade no Brasil. In: Fry, P. Para inglês ver: identidade e política na cultura brasileira. Rio de Janeiro: Zahar, 1981, cap. 4.

- John D’EMILIO. Capitalism and gay identity. In: Abelove, H; Barale, M; Halperin, D., org. The lesbian and gay studies reader. Londres: Routledge, 1993.

-Sergio CARRARA e Julio Assis SIMÕES. Sexualidade, cultura e política: a trajetória da identidade homossexual masculina na antropologia brasileira. cadernos pagu, 28 (2007):65-99.

12/mai

6. Revisitando o interacionismo simbólico (1). Paradoxos do estigma: a construção de identidades e estilos de vida.

- Howard BECKER. Outsiders: estudos de sociologia do desvio. [1963] Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2008. Cap.1: Outsiders; Cap. 2: Tipos de desvio: um modelo seqüencial.

- Erving GOFFMAN. Estigma. [1963] Rio de Janeiro, LTC, 1998, Cap. 1: Estigma e identidade social; Cap. 2: Controle de informação e identidade pessoal.

- Kenneth PLUMMER. O tornar-se gay: identidades, ciclos de vida e estilos de vida no mundo homossexual masculino. In: Hart, J. e Richardson, D., org. Teoria e prática da homossexualidade. Rio de Janeiro: Zahar, 1983, cap. 4.

- Carmen Dora GUIMARÃES. O homossexual visto por entendidos. Rio de Janeiro: Garamond, 2004. Cap. 3: Da semelhança à diferença.

- Isadora Lins FRANÇA. Sobre guetos e rótulos: tensões no mercado GLS na cidade de São Paulo. cadernos pagu, 28 (2007):65-99.

19/mai

7. Revisitando o interacionismo simbólico (2). Sobre a fluidez e a instabilidade das categorias e identidades sexuais.

- Albert J. REISS, JR. The social integration of queers and peers. [1961] In: Nardi, P. & Schneider, B., org. Social perspectives in lesbian and gay studies. Londres: Routledge, 1998.

- Laud HUMPHREYS. Tearoom trade: impersonal sex in public places. [1970]. New Brunswick: Aldine Transaction, 2009. Capítulos a indicar.

- Néstor PERLONGHER. O negócio do michê. [1987] São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2008. Capítulos a indicar.

26/mai

8. Revisitando o interacionismo simbólico (3). Sexualidade e gênero como performances

- Erving GOFFMAN. A apresentação do eu na vida cotidiana [1959]. Petrópolis, Vozes, 1975. Introdução e Cap. 6: A arte de manipular impressões.

- Harold GARFINKEL. Passing and the managed achievement of sex status in an “intersexed” person. [1967] In: Stryker, S. & Whittle, S. org. The transgender studies reader. Londres; Routledge, 2006.

- Esther NEWTON. Mother Camp: female impersonators in America. Chicago: The University of Chicago Press, 1972. Capítulos a indicar.

- Rosemary LOBERT. A palavra mágica dzi: uma resposta difícil de perguntar. Dissertação de Mestrado não-publicada. Unicamp, 1979. Introdução e Parte I – O Espetáculo.

Unidade 3 – Continuidades, deslocamentos e perspectivas: sobre alguns aportes recentes na teoria e na pesquisa sobre sexualidade

02/jun

9. Estratificação sexual e desestabilização identitária: teoria queer, política e representação de sexo/gênero.

- Gayle RUBIN, Pensando sobre sexo: notas para uma teoria radical da política da sexualidade (Tradução em português de circulação restrita). In: Abelove, H; Barale, M; Halperin, D., org. The lesbian and gay studies reader. Londres: Routledge, 1993.

- Eve Kosofsky SEDGWICK. A epistemologia do armário. cadernos pagu, 28(2007):19-54.

- Richard MISKOLCI. Comentário [à “epistemologia do armário]. cadernos pagu, 28 (2007):55-63.

9/jun

10. Gênero e performatividade: sobre corpos abjetos e além.

- Judith BUTLER. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2003. Cap.1; parte 4 do Capítulo 3 (Inscrições corporais, subversões performativas), e Conclusão.

- Mary DOUGLAS. Pureza e perigo. São Paulo: Perspectiva, 1976. Introdução e cap. 6.

- Berenice BENTO. Da transexualidade oficial às transexualidades. In: Piscitelli, A.; Gregori, M. F.; Carrara, S., org. Sexualidades e saberes: convenções e fronteiras.

- Larissa PELUCIO. Na noite nem todos os gatos são pardos: notas sobre prostituição travesti. cadernos pagu, 25 (2005): 217-248.

- Andréa LACOMBE. De entendidas e sapatonas: socializações lésbicas e masculinidades em um bar no Rio de Janeiro. cadernos pagu, 28 (2007):207-225.

16/jun – Seminário Diálogos Brasil-EUA

23/jun

11. Marcadores de diferença, categorias articuladas e interseccionalidades

- Donna HARAWAY. Gênero para um dicionário marxista: a política sexual de uma palavra. cadernos pagu 22 (2004): 201-246.

- Anne McCLINTOCK. Couro imperial. Raça, travestismo e culto da domesticidade. cadernos pagu, 20 (2003): 7-85.

- Avtar BRAH. Diferença, diversidade, diferenciação. cadernos pagu, 26, (2006): 329-376.

- Adriana PISCITELLI. Interseccionalidades, categorias de articulação e experiências de migrantes brasileiras. Sociedade e Cultura, Universidade Federal de Goiânia (no prelo).

- Laura MOUTINHO. Negociando com a adversidade: reflexões sobre “raça”, (homos)sexualidade e desigualdade social no Rio de Janeiro. Estudos Feministas, 14[1] (2006): 15-41.

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30/jun

12. Encerramento: Perspectivas sobre corpo, pessoa e cultura, em diálogo com teorias feministas e antropológicas recentes.

- Marilyn STRATHERN. Entre uma melanesianista e uma feminista. Cadernos pagu, 8/9 (1997): 7-49.

- Donna HARAWAY. Manifesto ciborgue: ciência, tecnologia e feminismo pós-socialista no final do século XX. In: Silva, T. T., org. Antropologia do ciborgue. Belo Horizonte, Autêntica, 2000, p.37-129.

- Edward LIPUMA. Modernity and forms of personhood in Melanésia. In; Strathern, A. & Lambeck, org. Bodies and persons: comparative perspectives from Africa and Melanesia. Cambridge University Press, 1998.

- David A.B. MURRAY. Queering the culture cult. Social Analysis. 46, 1 (2002): 81-89.

- Cristiane LASMAR. De volta ao lago do leite: gênero e transformação no Alto Rio Negro. São Paulo, Ed. Unesp, 2005. Cap. 4: De trajetórias, identidades e corpos.

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